A fobia social é muito mais do que timidez:
envolve uma ansiedade tal nos contactos sociais que pode levar ao
suicídio. A boa notícia é que o tratamento permite restaurar a confiança
e, com ela, a qualidade de vida.
Quem nunca se sentiu nervoso e ansioso
em determinadas situações? Num primeiro encontro, numa entrevista de
emprego, na apresentação pública de um trabalho? Provavelmente, já todos
sentimos aquela sensação estranha no estômago que nos faz recear o fracasso.
Mas há pessoas para quem qualquer uma destas situações sociais é causa de extrema ansiedade,
deixando-as mergulhadas num receio inexplicável e levando-as a fugir,
às vezes literalmente, do contacto com outros. São pessoas para quem o
simples uso de um telefone ou de uma casa de banho pública, uma simples
ida ao restaurante ou a uma loja se revelam experiências difíceis.
Iniciar uma conversa com alguém, permanecer num espaço com
desconhecidos, entrar numa sala quando todos já estão sentados são
igualmente momentos dolorosos, a evitar a todo o custo.
Estas pessoas sofrem de um medo irracional de actividades ou
situações que envolvam a interacção social - sofrem de desordem de
ansiedade social ou fobia social, caracterizada por múltiplos e complexos sintomas. A nível físico, a ansiedade é denunciada por rubor, suores, tremores, náuseas, tensão muscular, dificuldade em falar, mãos húmidas e frias, palpitações, perturbações do estômago e dificuldade em fazer contacto visual.
Já no domínio dos sintomas emocionais e comportamentais evidencia-se
um medo intenso de estar em situações com pessoas desconhecidas, o
receio de ser julgado pelos outros, de ser humilhado ou embaraçado, mas
também o receio de que os outros percebam a ansiedade.
Associadas a estes sintomas andam geralmente características
individuais como uma elevada sensibilidade à crítica, um défice de
competências sociais, dificuldade em ser assertivo e uma baixa
auto-estima.
Esta ansiedade levada ao limite é verdadeiramente perturbadora da
qualidade de vida, dificultando actividades do quotidiano como ir para a
escola ou para o emprego. Mas também frequentar um restaurante ou ir a
uma festa. A pessoa fica tão preocupada com a possibilidade de a
fobia se manifestar que foge de todas as situações que a possam
desencadear. Mas o pior é que esta preocupação é quanto baste para que
os sintomas se declarem e se agravem. É um ciclo vicioso.
Genes e ambiente
A fobia social é complexa nas suas manifestações e nas causas. Tal como outras desordens do foro mental, resulta de uma interacção entre genes e ambiente. Não há uma investigação decisiva, mas tudo aponta no sentido de uma causalidade múltipla, em que a hereditariedade desempenha um papel de contornos ainda pouco claros.
É que há famílias com mais propensão do que outras, mas não há a certeza de que essa tendência seja genética ou aprendida.
Os investigadores debruçam-se também sobre o papel dos químicos naturais do organismo, nomeadamente da serotonina, um neurotransmissor que intervém na regulação das emoções e do humor: as pessoas com fobia social parecem ser mais sensíveis do que as demais aos seus efeitos.
Em estudo está também a influência da amígdala cerebelosa, uma estrutura do cérebro envolvida no mecanismo de resposta ao medo.
Pessoas com uma amígdala mais activa poderão desenvolver maior ansiedade em situações sociais.
Entre as teorias encontra-se também a que responsabiliza o
ambiente familiar pela ansiedade: filhos de pais mais controladores ou
protectores tenderão a desenvolver maior ansiedade, da mesma forma que
filhos de pais extremamente ansiosos lhes poderão copiar os
comportamentos.
Parece igualmente haver uma relação entre as experiências da infância e a fobia social na idade
adulta: crianças humilhadas e rejeitadas ou vítimas de abusos e maus
tratos poderão vir a ser mais propensas a evitar o contacto social.
Antes que se complique
Dadas as repercussões na qualidade de vida e o risco de complicações é
fundamental reconhecer os sinais da fobia social o quanto antes e
procurar ajuda médica.
Não há um teste laboratorial que permita identificar esta desordem, mas sim uma avaliação física e psicológica que, através da descrição dos sintomas, conduz a um diagnóstico.
Entre os critérios considerados para essa avaliação incluem-se a
existência de um medo persistente em situações sociais, nas quais o
doente acredita estar a ser escrutinado, uma sensação de grande
ansiedade nessas situações, o reconhecimento de que o nível de
ansiedade é excessivo e desproporcionado, a fuga de situações e
experiências que possam produzir ansiedade e a interferência dessa ansiedade com o quotidiano e a qualidade de vida.
Face ao diagnóstico, tratar é fundamental. É que, sem tratamento,
a ansiedade social acaba por dominar a vida, interferindo com as
relações e as actividades: nos casos mais graves pode conduzir a
comportamentos como alcoolismo
ou toxicodependência e abrir caminho a estados depressivos ou até ao
suicídio. Este é o risco máximo, que se previne se os sintomas estiverem
controlados e o doente adoptar estratégias que o deixem mais confiante e
relaxado. É esse o objectivo do tratamento, cujas vertentes são os medicamentos e a psicoterapia, normalmente combinadas.
Entre os medicamentos destacamse os antidepressivos, os ansiolíticos e os beta-bloqueadores.
Quanto à terapia,
assenta na ideia de que são os pensamentos do próprio, e não outras
pessoas ou situações, que determinam o modo como se age ou reage: mesmo
que uma situação desagradável não mude, é possível mudar o modo como se
pensa e agir de uma forma positiva. O doente aprende a reconhecer e a
alterar os pensamentos negativos sobre si próprio.
Paralelamente, vai sendo exposto às situações que geram ansiedade,
aprendendo, a pouco e pouco, a enfrentá-las, ganhando confiança.
Este é um caminho feito de altos e baixos, com avanços e retrocessos, e que leva o seu tempo a percorrer até alcançar a meta.
http://medicosdeportugal.saude.sapo.pt/utentes/saude_publica/fobia_social_mais_do_que_timidez_1/1
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